Ilustríssima Conversa

Folha de S.Paulo

A equipe de jornalistas da Ilustríssima, da Folha, entrevista autores de livros de não ficção ou de pesquisas acadêmicas. read less
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Tiago Rogero: Brancos são o grupo identitário dominante no Brasil
09-11-2024
Tiago Rogero: Brancos são o grupo identitário dominante no Brasil
Em 2018, Tiago Rogero ouviu a escritora Conceição Evaristo falar, em uma palestra, que as escolas brasileiras ensinavam a Revolução Farropilha, no Rio Grande do Sul, mas não a Revolta dos Malês, levante de escravizados de Salvador em 1835. O jornalista diz que, depois disso, passou a pensar nas histórias nunca foram contadas ou silenciadas sobre a herança africana do país. Dessa inquietação, surgiu a ideia se debruçar sobre o passado do Brasil a partir das experiências e do protagonismo de pessoas negras. Nasceu assim o projeto Querino, investigação jornalística coordenada por ele que resultou em um podcast narrativo de oito episódios, lançados em 2022. A série em áudio acaba de virar livro pela Fósforo. O espírito da obra é ampliar e aprofundar questões e temas discutidos no podcast, mantendo a estrutura e o tom que centenas de milhares de ouvintes conhecem bem. Rogero, hoje repórter do jornal The Guardian, fala neste episódio sobre os desafios que enfrentou para transpor o áudio para o registro escrito e discute a dificuldade do Brasil de lidar com o passado escravocrata e reconhecer como africanos e seus descendentes forjaram o país. Ele diz que os brancos são o grupo que sempre dominou a pauta identitária brasileira e defende que a luta compartilhada com outros grupos étnico-raciais é essencial para o movimento antirracista hoje. Produção e apresentação: Eduardo SombiniEdição de som: Raphael ConcliSee omnystudio.com/listener for privacy information.
Ronilso Pacheco: Extrema direita usa gramática religiosa em projeto de radicalização
14-09-2024
Ronilso Pacheco: Extrema direita usa gramática religiosa em projeto de radicalização
A Igreja foi uma peça fundamental do colonialismo europeu e da escravização de africanos, mas a espiritualidade cristã pode se comprometer com um projeto de emancipação. Esse é o horizonte de "Teologia Negra: o Sopro Antirracista do Espírito", de Ronilso Pacheco, publicado em 2019 e relançado neste mês. Para Pacheco, a teologia não deve continuar a ser vista como uma área de estudo puramente especulativa, sem contato com a realidade social. Em vez disso, ele defende que se considere que a teologia nasceu no deserto, referência à jornada de libertação narrada no Êxodo. A religiosidade, nessa perspectiva, vem da experiência concreta da opressão —e a teologia negra, além de ressaltar as raízes africanas de acontecimentos e personagens bíblicos, disputa a própria ideia de uma espiritualidade universal, desvinculada da história dos povos. Pacheco é mestre em teologia pela Universidade Columbia, diretor do Iser (Instituto de Estudos da Religião), pastor auxiliar da Comunidade Batista e colunista do UOL. Na entrevista, ele afirma que a representação de Jesus como homem branco contribuiu para legitimar a escravidão e reverbera até hoje, por exemplo, na intolerância contra religiões de matriz africana. O pesquisador discute os riscos do nacionalismo cristão, movimento de extrema direita que, em sua avaliação, usa uma gramática religiosa para subjugar a sociedade a um cristianismo conservador, e aborda as perspectivas de organização política nesse contexto. Produção e apresentação: Eduardo SombiniEdição de som: Raphael ConcliSee omnystudio.com/listener for privacy information.
Marcelo Viana: Avanço da IA desafia ideia de superioridade humana
31-08-2024
Marcelo Viana: Avanço da IA desafia ideia de superioridade humana
Em 1611, Johannes Kepler apontou que organizar laranjas como os feirantes fazem hoje em dia —em arranjos hexagonais e camadas sobrepostas— era a melhor forma de aproveitar o espaço disponível. O astrônomo e matemático alemão, no entanto, não conseguiu provar essa conjectura na época e o problema só foi de fato resolvido em 2017, mais de 400 anos depois. Tanto tempo para tão pouco, muitas pessoas podem pensar. Afinal, que diferença isso faz? Em "Histórias da Matemática: da Contagem nos Dedos à Inteligência Artificial" (Tinta-da-China Brasil), Marcelo Viana mostra que até as pesquisas mais teóricas podem dar origem a novas tecnologias, mesmo que, em alguns casos, isso demore vários séculos. O pesquisador escreve que o problema do empacotamento de esferas (o exemplo das laranjas) ajuda hoje a detectar e corrigir erros de transmissão de informações e que pesquisas sobre números primos foram fundamentais para desenvolver a criptografia moderna, além de lembrar os desdobramentos na astronomia e na física, por exemplo, viabilizados pela matemática. Não que a utilidade imediata deva ser o único critério da ciência, diz Viana, diretor-geral do Impa (Instituto de Matemática Pura e Aplicada), no Rio de Janeiro, um dos mais renomados centros de investigação matemática do mundo, mas pesquisadores não devem perder de vista as consequências concretas dos seus estudos. "Histórias da Matemática" reúne, em edição revista e atualizada, colunas publicadas na Folha, onde Viana escreve desde 2017.See omnystudio.com/listener for privacy information.
Natalia Viana: Sem Assange e WikiLeaks, não teria havido Vaza Jato e Lula 3
06-07-2024
Natalia Viana: Sem Assange e WikiLeaks, não teria havido Vaza Jato e Lula 3
Natalia Viana tinha acabado de conhecer Julian Assange, em novembro de 2010, quando recebeu dele o recado em um papel: "Não fale uma palavra". A jornalista brasileira viajou para Londres sem saber quase nada sobre o projeto em que acabaria se envolvendo, mas logo se deu conta do alcance e dos riscos do que Assange e o WikiLeaks estavam planejando: a divulgação de 250 mil telegramas de embaixadas dos Estados Unidos. No recém-lançado "O Vazamento", a autora apresenta um balanço dessa experiência, que marcou a sua trajetória e mudou os rumos da sua carreira —bem como transformou o jornalismo nos anos 2010 e influenciou negociações diplomáticas e protestos populares ao redor do mundo. O livro transporta os leitores para o casarão, no interior da Inglaterra, em que a equipe se isolou antes da divulgação dos documentos e retrata a personalidade de Assange, registrando atitudes machistas e sua postura controladora, ao mesmo tempo que reconhece sua grandeza como figura histórica. O fundador do WikiLeaks passou os últimos 12 anos privado de liberdade. No fim de junho, ele se declarou culpado, como parte de um acordo para ser libertado, de uma acusação baseada na Lei de Espionagem dos EUA. Neste episódio, a jornalista diz que esse desfecho cria um precedente que ameaça o trabalho de jornalistas investigativos em todo o mundo e critica o uso, nos EUA, da ideia de segurança nacional para deslegitimar a publicação de documentos confidenciais de interesse público e apagar da história iniciativas como o WikiLeaks. Produção e apresentação: Eduardo SombiniEdição de som: Raphael ConcliSee omnystudio.com/listener for privacy information.
Raquel Barreto: Lélia Gonzalez captou resistência de negros em festas populares
22-06-2024
Raquel Barreto: Lélia Gonzalez captou resistência de negros em festas populares
Lélia Gonzalez (1935-1994), uma das mais celebradas intelectuais negras brasileiras do século 20, publicou dois livros em vida. "Lugar de Negro" saiu em 1982, em coautoria com Carlos Hasenbalg. Já "Festas Populares do Brasil" foi lançado cinco anos depois. A obra teve patrocínio da Coca-Cola, e seus 3.000 exemplares foram distribuídos como presente de fim de ano. Por isso, o livro sempre teve uma circulação muito restrita —até agora, quando chega ao mercado em uma edição da Boitempo com materiais inéditos e textos de apoio. Neste episódio, o podcast recebe Raquel Barreto, curadora-chefe do Museu de Arte Moderna do Rio, pesquisadora do pensamento de Lélia e autora do prefácio de "Festas Populares do Brasil". Ela discute como Lélia interpretou no trabalho a formação da cultura brasileira, partindo da ideia de que os africanos trazidos para o Brasil precisaram encontrar formas para recriar suas práticas culturais nos interstícios da escravidão, e fala sobre o papel das imagens na obra. O volume têm registros do bumba meu boi de São Luís, das cavalhadas de Pirenópolis, da celebração de Iemanjá de Salvador e do Carnaval do Rio, entre outras festas, produzidos por fotógrafos como Januário Garcia, Marcel Gautherot, Maureen Bisilliat e Walter Firmo. Veja aqui galeria de fotos do livro Produção e apresentação: Eduardo SombiniEdição de som: Raphael ConcliLeitura de trecho do livro: Priscila CamazanoSee omnystudio.com/listener for privacy information.
Pedro Arantes: PT virou unidade de política pacificadora
04-05-2024
Pedro Arantes: PT virou unidade de política pacificadora
A imagem de uma multidão rumando às sedes do poder para derrubar um regime político não era, até pouco tempo atrás, uma fantasia da direita. Rebeliões desse tipo foram uma utopia da esquerda desde, pelo menos, a Revolução Russa. A invasão do Capitólio e o 8 de Janeiro escancaram, nesse sentido, uma grande transformação simbólica. As sucessivas inversões entre direita e esquerda, ordem e desordem e pacificação e insurgência na história brasileira recente são o fio condutor de "8/1: a Rebelião dos Manés" (Hedra), de Pedro Arantes, Fernando Frias e Maria Luiza Meneses. Arantes, professor da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e convidado deste episódio, defende que as forças progressistas devem levar a sério as propostas e as ações da extrema direita brasileira. Para ele, o 8 de Janeiro é uma oportunidade para a esquerda refletir sobre seus rumos recentes —em uma conjuntura de perda de vitalidade e conformação em administrar uma ordem precária e desigual. Na entrevista, o pesquisador aborda as prisões e as condenações de participantes do 8 de Janeiro. Para Arantes, Alexandre de Moraes e o STF estão subindo a régua do punitivismo, o que instaura um controle totalitário sobre iniciativas de contestação social que se abate tanto sobre golpistas de direita quanto sobre movimentos de esquerda. Produção e apresentação: Eduardo SombiniEdição de som: Raphael ConcliSee omnystudio.com/listener for privacy information.