Iberê Carvalho

A Beleza do Som

22-08-2021 • 1 hora 9 min

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Edição e entrevista:

Ivanildo Jesus

Design:

Kas Hoshi e Victor R. Rodrigues

Se você já teve a experiência de ir até um concerto, ver uma orquestra ou algo do gênero, perceberá que há certa hierarquia em como as coisas acontecem. Há toda uma ritualística simbólica na música sinfônica. Primeiro entram os músicos, conhecidos como “Tutti” - o termo em italiano que significa todos - com um ar aristocrático, e prenhes da mais pura elegância. Em sua maioria extremamente bem-vestidos. Diz-se, que até a roupa íntima, combina com as cores da gravata. Depois que esses todos, o tutti, entram, a figura imponente de um violinista com ar confiante e circunspecto surge da coxia. O spalla, àquela à esquerda do maestro, não em ideias, mas em região, recebe sozinho os aplausos, e conduz a afinação. Do silêncio da plateia o oboé, se bem executado, emite um sonoro e aveludado “Lá”, após a ordem do spalla, os músicos o copiam, afinam seus instrumentos, e se preparam para começar o concerto. Sentados ainda, tutti e spalla, ouvem ao longe o som de pisadas firmes e decididas. Outra figura, ainda mais imponente e aristocrática, se esgueira da coxia, àquele que ficará à direita do spalla e na frente de toda a orquestra, o mestre da cerimônia, não o MC, mas o Maestro. Sob uma salva de palmas solo, o maestro é recebido com os músicos ficando em pé, em sinal de absoluto respeito e comprometimento. Após essa demonstração viril de liderança, no pódio, o maestro, com um gesto despretensioso das mãos, sinaliza aos músicos que se sentem. Pronto, o concerto está prestes a começar. Todavia há alguns pormenores que exigem a nossa atenção. Atrás do spalla, à esquerda do maestro, estão os violinos, os primeiros violinos, soberanos das notas agudas. No lado oposto, na maioria das vezes, violinos maiores, como dizem as crianças, ou, os violoncelos, ainda com os músicos sentados e entre as pernas. Logo atrás destes a baixaria, os contrabaixos. Com os músicos sentados em banquetas maiores que os demais naipes da orquestra. Falta outro instrumento, para que o naipe das cordas esteja completo, temos os primeiros e segundos violinos, cellos e baixos, falta o ripieno, um instrumento maravilhoso e absurdamente diplomático. Seu registro contempla o grave, o agudo e o médio, faltam as violas. Cuidado! Não confunda com a viola caipira. A viola da orquestra é diferente, é uma viola de braço. Maior do que um violino, e tocada também com um arco, na orquestra encontra-se perpendicular ao maestro, entre os segundos violinos e os contrabaixos. Depois de toda essa ritualística explicada, há outros detalhes ainda mais prementes. No palco há hegemonias além dos violinos. Nas orquestras em geral, vemos uma série de instrumentistas brancos. Brancos, homens, héteros e cis. As explicações para esse fenômeno sociológico vão desde o racismo estrutural ao colonialismo vigente. Em um país de maioria negra, quanto mais refinado o ambiente orquestral, mais veremos pessoas brancas, infelizmente. Onde estão os negros? Será que eles não se interessam pela música orquestral? Preferem a agitação do baile funk, do rap ou do samba? Temo que não. Talvez o acesso, por uma série de impeditivos violentos simbólicos, lhes seja negado. Contudo, alguns, cuja maestria da trajetória desponta além do preconceito, tem êxito na luta pelo espaço de representatividade contra a hegemonia da branquitude sinfônica. Para falar de representatividade, negritude, racismo no ambiente musical de concerto e viola a Beleza do Som recebe o músico, aluno da Escola Superior de Artes em Frankfurt, na Alemanha, Iberê Carvalho.